Todos nós vivemos primeiramente em busca de sensações, ansiamos por sensações. Estamos sempre à procura de novas sensações e toda a nossa vida é um esforço para obter novas sensações, trabalhamos e empenhamo-nos para ter novas sensações.
Mas o que acontece é que quanto mais sensações procuramos, mais insensíveis nos tornamos. A sensibilidade é perdida pelo crescimento da nossa objetividade. Parece paradoxal, mas é nas sensações, que a sensibilidade é perdida. Então precisamos cada vez mais sensações, e esse “mais” irá exterminar o nosso maravilhar-se. Então necessitamos de mais ainda e, finalmente, chega um momento em que todos os nossos sentidos ficam adormecidos.
O homem atual nunca foi tão insensível. Precisamos de mais sensibilidade.
Procure menos sensação e cresça em sensibilidade.
Para ser mais sensível é preciso controlar os impulsos de resposta, que com o tempo impedem que nos ajustemos ao presente, focando-nos no que já foi vivido. E para isto acontecer é preciso reconhecer os sentidos, tirá-los da sua visão do mundo.
Quanto tocar; torne-se o toque e não quem toca. Quando olhar, torne-se os olhos e não quem vê. Quando ouvir, seja os seus ouvidos. Esqueça tudo o mais, como se o restante do seu corpo tivesse deixado de existir e a sua consciência se transformasse apenas em olhos, ouvidos, pele e gosto. Então, os seus olhos serão capazes de olhar mais e você será capaz de olhar e ver o invisível.
Se todos os sentidos se recolhem então começa a meditação.
Quando desejamos fazer alguma coisa, primeiramente precisamos imaginar-nos fazendo-a, como nós a podemos colocar em prática. Com a meditação acontece a mesma coisa, daí a necessidade da saber exatamente o que é meditação.
Meditação é uma forma de lidar com nossa vida interna, isto é, com os nossos pensamentos subjetivos e as sensações que eles nos causam, desta forma, na presença das sensações, elas acabam por entorpecer a meditação. A nossa vida interior não está “dentro” de nós, ela está dentro e fora de nós num processo que se submete às contingências que criamos ao longo das nossas vidas. De alguma forma agimos e pensamos condicionados por inúmeras crenças e emoções que adquirimos desde que nascemos.
Nós chamamos todo o meio que agiu e age sobre nós de Ambiente, e tudo o que você é hoje e até mesmo quem você deseja ser, está condicionado pelo Ambiente. Se a
meditação é uma forma de lidar com os nossos pensamentos e com as sensações que sentimos, ela precisa mudar de alguma forma as nossas contingências, caso isto não ocorra, estaremos a tentar mudar algo pelo mesmo meio que já tentamos centenas de vezes e cujo resultado foi sempre o mesmo – o insucesso. Daí a meditação ser algo que pode mudar as suas contingências, somente ela pode fazer isto.
Se você sente medo, tem pânico, nem o medo e nem o pânico desaparecem quando você os tenta superar, pois eles ficaram fora de controle. Não há nenhuma mudança, porque as suas contingências são as mesmas e o único recurso é usar medicamentos que alterem a dinâmica química do seu corpo, que funcionam por um tempo,
mas as nossas contingências não mudaram e não mudam com nenhuma química.
Você pode até acreditar que mudou e que está mais feliz, que não sente medo, e isto muda enquanto você investir a sua energia nisso, em acreditar que mudou e logo percebe que não mudou, as contingências somente podem ser mudadas pela meditação.
Aqui as coisas começam a ficar interessantes, ao longo do tempo tendemos a perceber como é difícil mudar a pessoa em quem nos tornamos, tentando ser quem desejamos ser, isto é um bom sinal. Se você acredita ainda que pode mudar de alguma forma, então a Meditação ainda não serve para si, é preciso que você chegue ao autoconhecimento de que nada pode fazer você mudar, só aí estará realmente pronto para a Meditação, pois ela não é
uma crença, nem um conhecimento e nem uma projeção de quem você deseja ser.
Se já tentou tudo e percebeu que não conseguiu mudar as suas contingências, então está pronto para a Meditação. E compreenda que as demais pessoas estão tentando a mesma coisa, daí que o que você percebe delas não é a verdade delas, mas o investimento delas nos demais para buscar nos outros a sua própria mudança, mas pelas vias objetivas.
Porque não conseguimos mudar quem nós somos?
Tudo em que você se tornou não está certo ou errado, foi o meio onde viveu e como reagiu a ele ao longo de sua vida que o tornou naquilo que você é, tudo isso, cada palavra, cada emoção, cada ação em toda sua vida está limitada pelas contingências que você não pôde alterar, elas já ocorreram e irão continuar a ocorrer assumindo o controle sobre os seus impulsos.
Se você tentar reinventar-se, projetando-se em alguém, isso não irá mudar o seu passado, se tentar de alguma forma reconhecer quem você é, saiba que quem interpreta isso de forma otimizada no presente, é você mesmo.
Meditar é expandir quem nós somos, ou seja, todos os dias a natureza e todo o ambiente, está num processo de mudança contínuo, todo o Universo se expande constantemente e cria novas oportunidades para nós e de uma forma geral, tendemos a reagir da mesma forma como reagimos ontem, pois estamos presos pelas contingências criadas sem o controle inibitório – automatismo. Todos estamos limitados por elas, e meditar é justamente conseguir superar as nossas contingências, e assim entrar novamente no fluxo expansivo da vida, sem ilusões.
Por vezes abre-se uma janela existencial e por ali vemos uma oportunidade expansiva e sentimo-nos muito bem, completos e satisfeitos.
Para meditar é precis também entender um princípio que diz que, nós somos uma pessoa com a nossa singularidade, nossa intimidade, e subjetividade, e quem a conhece somos apenas nós mesmos. Esta singularidade é tão íntima e pessoal que não há como expressá-la. Este regresso à intimidade e ao recolhimento na
sua subjetividade, na sua espiritualidade, já é uma forma de expansão que diz respeito a pessoa social que vive em sociedade e interage com os outros.
Se de alguma forma excluir a sua espiritualidade, até por puro desconhecimento e procurar por mais sensações, a sua vida espiritual estará prescrita, isto é, perdeu o prazo da sua realização, e isto ocorre todos os dias, e neste caso o que foi excluído da sua vida espiritual, irá voltar pelo lado de fora como uma projeção. O mesmo ocorre se você tentar ser do lado de fora, no lado objetivo, aquilo que você é na sua vida íntima, subjetiva. Você tenta ser sincero com seus amigos e expõe a sua intimidade, isso significa que você está excluindo a sua vida íntima de si mesmo, e a tornar-se social. Como isto é comum, as pessoas vivem presas do lado de fora de si mesmas, vivendo na vida social a sua vida íntima, então as contingências não mudam, elas reforçam-se ainda mais, sentem-se ainda mais. O fenômeno da Selfie é isto, tentar ser do lado de fora aquilo que não se é na sua vida íntima, mas só funciona como imagem.
A realidade das pessoas é povoada de criações da sua vida espiritual projetadas nos parentes, nos vizinhos, maridos, esposas, filhos, colegas de trabalho etc. então as pessoas querem mudar os demais para ter a sua própria vida espiritual novamente, percebe agora que é isto o que acontece?
Já, quando as suas contingências são transcendidas pela meditação todos os dias, surge uma estabilidade íntima, uma visão remota que supre todas as suas
necessidades espirituais. Mas isto não tem uma explicação e nem pode ter, é uma energia misteriosa, é de todos, é intersubjetiva, é do inconsciente.
Desde que crescemos como crianças no mundo não planeamos a nossa vida, apenas vivemos, e chega um momento em que o mundo se esgota, e vem a depressão. O fluxo interrompido com a vida subjetiva, íntima, precisa ser reparado, e o único reparador capaz de fazer isto somos apenas nós mesmos – mais ninguém.
Pode optar por novos começos, a escolha é sua, mas nada funciona, somente meditação funciona, somente ela produz esse efeito profundo e transformador.
Há apenas uma forma de resgatar novamente a visão remota da realidade, como na nossa inocência quando éramos crianças. Mesmo com todo o conhecimento do mundo que possamos ter, esta é a forma, a única, a Meditação.
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