Muitas pessoas idolatram os seus problemas. Certamente todos nós já nos deparamos com pessoas que exibem rostos de satisfação, uma espécie de orgulho quando falam dos seus dramas, são verdadeiros especialistas. Os problemas tornam-se nos seus conceitos, nas suas inevitáveis verdades. Os problemas no trabalho, a saúde, falta de sorte aos amores, problemas conjugais, etc. Percebemos que essas dificuldades as definem, tornando-as pessoas carentes e dignas, com problemas concretos e a precisar de atenção. Por escolha todos esses problemas passam a fazer parte de si. Uma dor que as faz sentir vivas, com a qual se identificam e lhes dá um sentido à vida. Passam anos nesta rede dolorosa e sempre que tentamos sugerir algo para que saiam, elas encontram logo uma justificação perfeita, ou porque já tentaram e não deu certo, ou porque houve alguém que disse que não valia a pena, etc. Inconscientemente recusam ajuda para que não lhe retirem essa dor pois levaram anos a identificar-se com ela, tem imensa dificuldade em abandonar esse sistema de dor que os alimenta sem a qual apenas ficariam num vazio existencial.
 
– Não consigo! – Não posso! – São as duas expressões limitadoras mais usadas e colocam sempre uma postura defensiva e deformadora da existência pois bloqueiam qualquer possibilidade de evolução ou superação de alguma dificuldade.
 
Há também uma habilidade para encontrar desculpas para tudo, a culpa vem sempre de fora, do outro. Todas as ações são mascaradas de soluções que no fim em nada resultam para que tudo se mantenha, age-se para fazer a manutenção da dor pois tudo o que não leva aí é como se estivesse oculto por uma neblina espessa que não permite enxergar outra realidade. É muito difícil ajudar alguém assim pois a vontade e a atitude tem de vir da própria pessoa.
 
Se olhar-mos para nós mesmos veremos que em muitas situações estamos agarrados aos nossos problemas como lapas, independentemente do grau de gravidade que possam ter. Fazemos mais conversa sobre esses assuntos, deparamo-nos com uma espécie de sentimento que nos torna especiais mesmo que isso envolva sofrimento, podendo cair na vitimização. Podemos sempre enfrentar o problema e resolve-lo o quanto antes, ou prolonga-lo e acarinha-lo, promovendo a sua manutenção, como se costuma dizer – empurrar com a barriga. Nós não somos o problema, somos algo muito acima disso, não devemos por isso confundir nem nos identificarmos com ele.
 

Todos temos que passar por fases menos boas, passar pela dor faz parte do nosso processo de vida. Nem tudo tem que ter uma causa ou uma justificação, devemos aprender a dar espaço e tempo a tudo o que vem ter connosco, dar um passo a trás e sair fora dos problemas e com bom senso resolve-los, mesmo que isso implique alguma cedência, aceitação ou perda.

Escolher a dor é ficar nela, é escolher o caminho mais longo para a felicidade. A dor também é viciante, é como o álcool ou outra droga, quanto mais se toma mais se sente e intensifica. Da mesma forma também a felicidade é viciante, a escolha é sempre nossa.

Há pessoas que já nem conseguimos imaginar felizes, pois arrastam anos a fio os problemas e as respetivas justificações para se manterem neles, quando os visualizamos vemos uma amálgama pessoa/problema, envolta numa energia muito própria. A vida lhes dará sempre oportunidades para que saiam dessa caixa hermética, mas mais uma vez a escolha será de cada um.

Jamais poderemos ambicionar o melhor da vida se não aprendermos a diferenciar aquilo que somos daquilo que nos envolve, isso é consciência, é bom senso, é auto-observação, é o caminho.

 

Carlos Dionísio