Quando algo termina, por muito que nos custe ver, há sempre algo que começa. O fim de uma relação pode ser sentido de imensas formas de acordo com as circunstâncias, mas uma verdade é comum a todas as situações, a responsabilidade em última instância, é sempre sua. Foi você que aceitou começar a relação, se o fez foi porque criou alguma expetativa em relação a essa pessoa, foi você que aceitou ficar e alimentar essa mesma expetativa. Da mesma forma a outra pessoa também tem responsabilidades, porque também ela tinha expetativas em relação a si. Cada um é responsável por estar a vivenciar esta situação terminal, que reflete muitas das opções de vida que tiveram enquanto durou.
Se alguém entrar na gruta de um urso que lhe parece amigável e carinhoso e sair de lá trucidado, de quem é a culpa? A maioria dirá, numa relação, que a culpa é do urso, – Coitadinho de mim que até ia com tão boas intenções.
Se ficam ressentimentos, frustrações, acusações, é porque na verdade, essa relação não terminou, apenas se transformou em algo diferente, mais grave, mais denso, num jogo de egos feridos. É porque ninguém aceita que errou logo no momento em que resolveu entrar na “gruta do urso”
Depois de um epílogo, de uma perda, há sempre a possibilidade de nos renovarmos, mas para isso temos de colher os ensinamentos do que aí vivemos. O que correu mal, onde procedemos de forma arrogante, irresponsável, infantil etc. Se não nos dermos tempo para que essas verdades, esses ensinamentos venham até nós, o mais provável é voltarmos a entrar logo na primeira gruta que nos aparecer, habitada pelo ser mais fofinho e carinhoso que já mais vimos.
É importante aceitar a culpa e as consequências como pilares estruturais para poder construir algo diferente no futuro. Quando isso não acontece é um sinal evidente de imaturidade emocional que gera sempre dependência. Fica-se dependente porque procuramos no outro algo que ele verdadeiramente não nos pode dar, o nutrimento e o equilíbrio emocional, algo que só se consegue encontrar dentro de nós. Sem esse equilíbrio emocional, temos a tendência de conduzir a relação de forma a preencher essa carência, quando isso deixa de acontecer a relação acaba, acaba porque começou pela razão errada. Procuramos quase sempre no outro aquilo que ele não nos pode dar, o problema é que a grande maioria das pessoas demora muitos anos de uma só vida para descobrir isso, por outras palavras, demora muitas relações para entender ou tal nunca chega a acontecer.
É comum na nossa sociedade, pela pressão que ela só por si exerce, que muitos sejamos levados a usar os relacionamentos como forma de fugirmos de nós próprios, de vermos a relação/casamento, como uma forma de alcançar a felicidade. Pode ser, mas também pode não ser, vai depender da gruta que se escolhe e da criatura que estiver lá dentro, e principalmente do nosso grau de maturidade para nos relacionarmos e entendermos o que queremos da vida. Da mesma forma o “não relacionamento,” ou o receio que temos dele, também pode ser uma fuga de nós próprios. Os outros refletem aquilo que nós somos, e por vezes, não querer relações pode ter a ver com medo daquilo que podemos ver refletido.
Também é comum, por falta desse entendimento, aceitar a relação em detrimento daquilo que sente, negando o seu Ser, a sua individuação, sujeitando-se com todas as consequências, de uma forma inconsciente, ao sofrimento e dor que isso implica no processo evolutivo.
Voltando mais uma vez à nossa parábola, tantas e tantas pessoas andam repetidamente de “gruta em gruta” sem perceber que o mais belo e carinhoso Ser, é um Ser livre que nada quer, a não ser Ser ele próprio. A relação não é dele, nem ele é a relação. Aquele que vê num relacionamento não um fim, mas sim uma partilha de vida, de experiências e que aceita as diferenças do outro com naturalidade, sem que isso altere o seu amor. Aquele que aceita o início como aceita o fim, que aceita a alegria, a tristeza, a saúde e a doença da mesma forma, como vivências plenas sempre embutidas de fatores que o levam a ser a cada dia, uma pessoa melhor onde o amor incondicional esteja sempre mais presente.
Não estamos nesta vida, nesta nem noutras reencarnações, para sermos pais, filhos, esposas, empregados, patrões, médicos, agricultores, engenheiros etc. ninguém nasce com esses propósitos como fim. Tudo isso são situações em que nos vemos envolvidos para vir resolver uma questão maior, são personagens e cenários em que somos colocados para termos a oportunidade de nos reencontrarmos com o nosso Ser, com a nossa Alma. Aquilo a que habitualmente chamamos felicidade, e à qual teimamos em atribuir significados errados buscando-a fora da nossa essência.
Se terminou uma relação – Pare! Aproveite essa oportunidade maravilhosa de ficar consigo, de se ouvir, de se sentir, de se questionar, de mudar algo em si que lhe permita ser alguém diferente daquela pessoa que foi, repare, se deu errado é porque você também errou. Conecte-se com o seu lado espiritual pois se tentar apenas racionalizar tudo o que viveu, poderá voltar ao ponto de partida e cometer os mesmo erros, o ego é traiçoeiro e ilusório e muito poderoso também. É necessária muita perspicácia para sentirmos quando é ele que nos fala ou é a nossa mais pura intuição. Tenha a certeza que há algo em si como em todas as pessoas, que precisa ser trabalhado, seja o que for; controle, dependência, medo, apego, auto-estima, etc. É essa descoberta e o empenho que colocar na sua evolução como Ser uno, que vai determinar a qualidade das relações que terá daí para a frente. Se não o fizer a probabilidade será encontrar mais do mesmo.
Depois desse trabalho profundo, mas necessário, passará a ver nos seus potenciais parceiros, qualidades que antes não via, passará a valorizar aquilo que realmente é importante, a ver a relação como algo para lá de si mas como um que acrescenta muito à sua existência se for vivida com desapego, respeito, liberdade e muito amor.
Por tudo isto – Pare!
Carlos Dionísio
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